terça-feira, março 28, 2006

Animalidades

     Não gosto de touradas! Acho um espectáculo abjecto, sem sentido, senão o da sacralização da virilidade à custa do sofrimento alheio. Acontece com muitos automobilistas, e com o exército norte-americano, também. Sempre achei o circo um espectáculo patético, e muito mais com os pobres animais amestrados. Lembro-me da primeira vez que fui ao Jardim Zoológico, e de quando parei em frente ao célebre elefante do sino, olhar os seus olhos e sentir a sua humilhação resignada, mas também de sentir que ali havia vida. Vida com vontade própria, com alma, ainda que amordaçada. Com alma, sim, pois segundo a etimologia da palavra animal, provém do latim anima, que é a raiz da palavra alma.
     Mais tarde li que os teósofos, que defendem a teoria da reencarnação, crêem que os animais pertencem a almas-grupo, ou seja, que cada espécie pertence a uma alma comum, e cada reencarnação aporta a experiência da sua existência encarnada ao resto do grupo da alma. Também defendem que o que diferencia o homem dos outros animais, não é a inteligência, mas sim a consciência. Da inteligência temos tido cada vez mais provas, de que é cada vez menos um exclusivo humano. Da consciência, eu mesmo suspeito que também não.
     Hoje em dia considero-me uma pessoa incapaz de fazer mal a uma mosca.............literalmente, e no sentido budista do respeito por todas as formas de vida. Não, não sou budista, apenas tento ser coerente com aquilo que acredito, e acredito que uma mosca não merece morrer por ser mosca, assim como um touro não merece sofrer e morrer na arena, por ser touro. Nem uma foca merece morrer por ser foca e haver muitas. Segundo dizem também começa a haver demasiados seres humanos, e ninguém pratica o genocídio sob essa razão (outras igualmente estúpidas e crueis, sim). Mas antes de me considerar pessoa, homem, humano ou mamífero, sou um animal como outro qualquer. Existem outras diferenças entre os humanos e as outras espécies. Os humanos trabalham, os humanos matam-se em massa entre si, os humanos passam a vida buscando desesperadamente uma segurança ilusória com o fim de ignorar a inevitabilidade da morte. Os humanos quase sempre escolhem a pior alternativa para a liderança do seu grupo, os humanos têm sérias dificuldades de se integrarem no seu grupo, e tudo se processa numa aprendizagem anti-natural, os humanos julgam-se os donos do mundo. Os humanos matam outros animais para fins que não são o da alimentação de sobrevivência. Os humanos não se preocupam com a sobrevivência da sua própria espécie, mas sim do da sua própria classe dentro da espécie. Os humanos atribuem à palavra humano um sentido que pouco tem a ver com a realidade do que é um ser humano, mas sim do que todos gostariam que fosse. Os humanos dormem melhor quando se preocupam pelas grandes catástrofes humanitárias ou ecológicas, mas em nada alteram o seu quotidiano para que essas catástrofes não aconteçam. No entanto pensam em si mesmos como pessoas melhores do que as outras. Os humanos são extremamente arrogantes, quer quando o demonstram claramente, quer quando mais perigosamente o disfarçam. E por causa desse narcisismo delirante, o ser humano confia aos seus deuses o futuro da sua espécie, através das suas orações, livrado-se assim da sua quota-parte de responsabilidade, e podendo de novo, de alma limpa, sentir-se extremamente bem dentro da sua pele. Sim, o ser humano também é cínico! E cego! Cego porque apenas quer ver com os olhos de ver, e não com os de sentir, e assim afasta da sua vista tudo o que não quer ver, como a dona de casa badalhoca que varre o lixo para debaixo do tapete. Olhos que não vêem...

     Tudo isto veio a propósito de uma posta do Cobre & Canela. Não acredito no fim do mundo, pois a Natureza é muito mais poderosa e sábia que todos os humanos juntos (basta relembrar quantos desastres naturais houveram nos últimos 2 anos). Mas começo a crer no fim da espécie humana, através do suicídio. No entanto, como diz um querido amigo meu "Se se entende, as coisas são como são. Se não se entende, as coisas são como são."

9 comentários:

Na Lua Nova disse...

Gulp!
Estou desde ontem a digerir a intensidade...

O fim do mundo como nós o conhecemos (lá diz a canção) será sem dúvida provocado por nós, bicho-humano.
O Homem é um bicho medroso, e como tal, por forma a controlar o medo tenta desesperadamente manipular o mundo à sua volta, numa tentativa vã de ultrapassar o medo. Medo de tudo o que não consegue explicar e também daquilo que consegue explicar mas não consegue perceber porque existe assim.
Por isso se auto-destrói! Na realidade poucos são aqueles que conseguem atingir um nível de consciência que os faça mudar de atitude e inverter esse processo de autodestruição. Os animais têm essa consciência, esse instinto de sobrevivência, o Homem acomodou-se a negligência-lo, como criança mimada. Um exemplo tão banal como fumar (perdoem-me os fumadores!), hoje em dia não se pode dizer que se desconhece as consequências do tabagismo, e no entanto, cada vez mais pessoas fumam... no fundo consomem substâncias que alteram o estado de consciência, porque dá demasiado trabalho estar atento a ela!
Se cada humano se responsabilizar por si próprio, pelo pequenino pedaço de Terra e pelos que o rodeiam...
Mas, de facto, se imaginarmos a Terra como um ser vivente, reagirá, como tem sempre reagido, às agressões de que é vítima... E aí, salve-se quem puder!
Talvez seja utopia minha, mas continuo, ainda assim, a ter esperança!

Beijocas

zmsantos disse...

Olá João. Este comentário não terá a ver com o 'Post' mas não pude deixar de referir a aprovação do Estatuto da Catalunha pelo governo de Zapatero. Esperemos que resulte na prática.

Um abraço

ZM

SDF disse...

Porque é que eu haveria de estar zangada contigo, rapaz? Olha que essa não percebi mesmo...

A Burra Nas Couves disse...

Bem, repostas por ordem. Sim, Ana, eu também penso que o medo é a raiz dos males da humanidade, e de tantas acções estúpidas, feitas sob pretextos mais absurdos ainda. Mas o medo é muito difícil de vencer, sobretudo quando se é educado nele, e quando se é diariamente incentivado a viver nele.
Zé Manel, obrigado pelo comentário! Ando há que tempos a pensar em escrever uma posta sobre o assunto, para dar conta da celeuma que levantou todo o processo do novo estatuto da Catalunha. Tenho fé de que vai ser aplicado, pois os políticos catalães, antes de ser políticos, são muito catalães, ao contrário de outros que conheço. No entanto, nem tudo são rosas obviamente, e a Catalunha não é, nem nunca foi só Barcelona. Vamos lá a ver se arranjo um tempinho para explicar a coisa ao pessoal, sem que se torne num tratado de política. É que eu costumo perder-me nos detalhes, e depois saem textos imensos, hahahahahahaha
Sandrita, é que tens a Burra muito abandonada, e já estava com saudades de ver a tua carita aparecendo pelos comentários. Don't be such a stranger!! Dantes até "puxavas" o rabo à Burra para ela zurrar (tenho tudo devidamente documentado, caso seja necessário), e agora nem um arzinho da tua graça. Foi preciso rebaixar-me à chantagem psicológica, para que te dignasses a passar pelo estábulo.

Na Lua Nova disse...

Claro que o medo é díficil de vencer, sobretudo quando e porque estamos emersos nele. Regra geral vemos o "filme" demasiado próximos do ecrã, e perdemos a clareza de espírito que a perspectiva nos trás... é curioso como a introdução da perspectiva na pintura, no final da idade média, aportou uma nova visão do mundo na sociedade da altura... às vezes é só preciso começar a dirigir a mudança para esse "ponto de fuga" que nos permite ver muito mais do que apenas aquilo que está à frente do nosso nariz! :)

Beijocas

M&M disse...

Alô João! Bom Blog! Vim retribuir a tua visita à OVELHA... Ovelha e Burra já temos, agora é escolher canário para cantar que é o que não falta e faremos a nossa banda... THE ANIMAIS.
Grande abraço e tudo de bom!
Miguel

A Burra Nas Couves disse...

Ana, essa imagem de ver o "filme" demasiado próximo do ecrã, é uma preciosidade. Acertaste na mouche! Bingo! É exactamente disso que se trata. O problema põe-se quando a gente se começa a sentir um pouco sozinho nas filas de traz. Se não se sabe lidar com isso, a tendência é de reaproximarmo-nos dos outros, ainda que já nem olhemos para o ecrã.

Miguel, muito benvindo ao estábulo! Tens aqui uma casa às ordens para quando quiseres passear a ovelha. Uma grande abraço, e saudade.

SDF disse...

Tão quiduxo!!!

Mas tu também não tens postado muito...

E eu ando numa roda vida de trabalho e exames da universidade (isto de querer fazer 3 anos em 1, é obrá, né?) e ainda mais uns "carroceis emocionais" que não estavam mesmo nada no programa para este ano, mas... há coisas que não escolhem dia nem hora, não é verdade? E a gente tem de se aguentar com elas, porque se é "mal com elas" é ainda "pior sem elas"...

Mas eu voltarei a animar a burra quando estiver mais desafogada. Até lá, e como diria alguém que me é muito querido: "Silêncio não é esquecimento". Keep that in mind!

P.S.: Mandei-te um mail para o GMAIL - Recebeste?

Anónimo disse...

Olá! que animação este mural de comments!!! Antes de mais, parabéns Jonhy, o texto está fantástico, aliás, é igualzinho a um que eu queria escrever!! LOL!! E sobre o bicho homem haverá sempre tanto a dizer! Acho que vou dedicar-me a isso no meu próximo post!
Novidades: Depois do meu primeiro Blog dedicado ás minhas viagens pelo Mundo, construí outro que apelidei de: Suave agitador de Mentalidades, onde se fala de tudo, Inquietações, Música, etc. Passa por lá!! Parabéns pelo enérgico despertar da Burra! Isso é que é Feno de primeira!
http://jazzfazarte.blospot.com
Abraços
Vasco